Moçambique on-line


Artigo do metical de 15 de Setembro 2000


Sim, mas...

(Maputo) O Presidente Joaquim Chissano disse ontem, numa entrevista à BBC World, que não é fácil, para Moçambique, tomar uma posição dura contra o regime de Robert Mugabe sobre o que se passa no Zimbabwe, justificando-se, não com o fundamento na sua amizade com Mugabe, mas com a ideia de que se trata de assunto sensível.

"O Zimbabwe é vizinho de Moçambique e a nossa economia depende, nalguns pontos, do que acontece na economia do Zimbabwe. Quando a economia zimbabweana vai mal, quem primeiro sofre é Moçambique. Temos caminhos de ferro, portos e electricidade que servem o Zimbabwe. E temos fronteiras comuns com muita actividade comercial. Daí que, quando há instabilidade lá, o primeiro que sofre é Moçambique".

O jornalista da BBC retorquiu que a estabilidade é geralmente baseada na justiça. Chissano disse que concordava.

Acredita que os políticos, quaisquer que sejam, devem respeitar a lei?

"Sim, eles devem ser respeitadores da lei".

O senhor é respeitador da lei no seu país?

"Sim, sou".

E se um juiz tomar uma decisão, você cumpriria?

"Sim".

Então, quando Robert Mugabe diz que os juizes não têm o direito de dar instruções ao presidente, você não compartilha dessa opinião.

"Não compartilho a visão de que os juízes não têm o direito de dar instruções ou tomar decisões. Eu pergunto-me é se as condições para implementar as decisões estão criadas".

Mas lei é lei.

"Sim, mas a aplicação da lei em certos casos pode levar ao caos e outras consequências adversas, as quais não eram intenção de uma decisão judicial. Então, temos que ser conscientes".

Quem decide que o caos depende das decisões judiciais e quem decide se essas decisões devem ou não ser ignoradas? O que me está a dizer é que os políticos estão acima da lei, pois são eles que decidem que decisões judiciais devem seguir.

"No caso do Zimbabwe, os juízes concluiram que havia uma violação legal. E decidiram que a Polícia e o Exército deviam intervir para retirar as pessoas das farmas. Mas você tem uma Polícia composta quase pelas mesmas pessoas que ocuparam as farmas. Como político, você vai ter que perguntar-se como e quem deve utilizar esse instrumento legal. Como usar a lei sem criar o caos. No caso do Zimbabwe, se os zimbabweanos deviam ou não fazer o que a lei pedia. Eu estou a tentar ver, em termos claros, pois eu estou próximo deles. Quem são as forças da Polícia e do Exército e quem são as pessoas que querem comprar as terras".

Está a dizer que a lei é um instrumento flexível e que depende muito dos políticos...

"Não, aqui os políticos não têm a prerrogativa de decidir se uma decisão judicial é ou não correcta".

Mas é o que aconteceu no Zimbabwe, não é? O governo do Zimbabwe fez isso. Eles disseram que a ocupação das farmas podia ir avante.

"Você está a falar como um jornalista ou político de um outro lugar, que não está lá no terreno. Mas a forma como as coisas são ditas numa situação daquelas causa problemas. (...) É uma questão muito sensível".

Esta crise no Zimbabwe não pode levar à emergência de um novo tipo de racismo no continente? Falo especificamente por causa do que os farmeiros brancos têm estado a ouvir: "África é para os africanos negros. Esta é minha terra, que foi roubada pelos colonialistas". O sr presidente apoia este tipo de declarações?

"Creio que é um tipo de declarações que não tem conotação muito séria".(...)

Moçambique está preparado para oferecer terras aos farmeiros zimbabweanos brancos?

"Nós não pensamos nesses termos. Nós estamos preparados para cooperar com qualquer zimbabweano que se queira instalar em Moçambique. E não é uma decisão baseada na ideia de que eles estejam a sair do Zimbabwe devido à actual instabilidade. Receberíamos os agricultores zimbabweanos da mesma maneira que recebemos os portugueses e os sul africanos".
(da redacção)
 

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