Na campanha de justiça por Carlos Cardoso: Há agendas ocultas e racismo, diz MNE (Londres) O ministro moçambicano dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, Leonardo Simão, diz que na campanha que tem visado a identificação e captura dos assassinos do jornalista Carlos Cardoso, há agendas políticas ocultas e ate mesmo manifestações racistas, que só o tempo poderá explicar. Em resposta à pergunta sobre como interpretava o assassinato de Cardoso e o seu impacto, Simão começou por lamentar que um profissional do seu calibre - tão devotado à causa do seu país e à promoção do bem comum - tenha sido cobardemente assassinado, adiantando, contudo, que entendia que apesar de que a campanha ser uma boa iniciativa para o combate ao crime organizado, ela incorpora "fenónemos que têm estado a acontecer no nosso país, que ainda estamos à espera de ver o seu desfecho final". Nas suas declarações, feitas na semana passada em Londres, Simão vincou que "no fundo, tem havido um ataque concertado contra o Governo e com um objectivo claro", visando desacraditá-lo. "Querem que façamos milagres que até países sofisticados não podiam fazer. O tipo de acção concertada contra o Governo chega a dar a entender que há actores políticos na nossa sociedade que não querem apresentar-se como um partido político claro. Penso que há partidos políticos clandestinos. É mais que uma acção da sociedade civil. Há partidos políticos mal-disfarçados. Se certos cidadãos querem fazer política, devem fazê-la claramente. Mas nebulosamente já não é bom para o país e para a própria sociedade. A mim preocupa-me, e até perturba-me bastante. Porque podemos criar problemas desnecessários e desagradáveis no futuro", disse Simão, pouco antes de partir de Londres, onde estava para tomar parte numa conferência sobre a resolução de conflitos no mundo, a convite do governo britânico. Ele disse ser muito a favor da campanha em prol da captura dos assassinos de Cardoso, mas que já não acha correcto que certas pessoas se sirvam da sua morte para prosseguir outros fins, e que tanto quanto ele conheceu a natureza e caracter do malogrado jornalista, se estivesse vivo, não iria aprovar. Simão insistiu que estas suas asserções são ainda "preliminares", mas que já não tem dúvidas que com o tempo, tudo virá ao de cima, para se entender que se tratava de uma acção concertada visando um objectivo já antigo, mas vestido com roupas diferentes. "Ha muita carga de racismo. Quando é um preto (que é assassinado) não há assim tanta exuberância ou alarido. É preciso não esquecer que tivemos no passado problemas de racismo. E agora parece que voltamos a esse passado, que pensávamos que já fazia parte da nossa história. Mas creio na capacidade analítica dos moçambicanos, e iremos entender e lutar contra esta nova vaga de racismo. Ha formas disfarçadas de racismo", disse insistentemente Simão. Vincou que este tipo de reacções emocionais excessivas quando há um crime que envolve uma pessoa de raça branca, não acontece só em Moçambique. "A morte de um branco em África é motivo de grandes parangonas e outras exigências impossíveis", disse Simão, insistindo que "há países que querem que nós façamos milagres que eles próprios não são capazes". Vincou também que "mesmo aqui na Grã-Bretanha, que é uma sociedade com uma das melhores Polícias do mundo, com câmaras fixas em sítios públicos que filmam tudo o que acontece, há crimes que dificilmente se resolvem satisfatoriamente senão passados muitos anos". Ele deu como exemplo o assassinato da famosa jornalista britânica Jill Dando, há dois anos, mas que até aqui não se sabe ao certo quem a matou. "No entanto, ocorreu num pais muito bem policiado". Ele insistiu que não se pode medir uma investigação em função do tempo que passa desde a ocorrência do crime como se tem feito no caso de Cardoso. Deixou claro que não discorda que possa haver lacunas e outras falhas na investigação e que possa ter como uma das razões a fragilidade do sistema policial moçambicano, mas que já não pode admitir que se use isso para declarar a falência do Governo. Simão disse que, em várias reuniões, ele e outros delegados africanos tem estado a denunciar esta tendência de dar mais valor à morte de pessoas de certa cor que à de outras. Disse que essa tendência tem sido replicada pelos meios de comunicação social dos países ocidentais ou ligados a sectores populacionais que padecem do vírus racista. Lamentou que pessoas com agendas ocultas "se aproveitem da morte de Cardoso para atingir outros fins", o que "é imoral" e se Cardoso pudesse ver, não iria gostar. A mesma análise de Simão teve um outro membro do governo moçambicano, o Ministro dos Recursos Minerais e Energia, Castigo Langa. Respondendo à mesma pergunta colocada a Simão, Langa começou por dizer que, dadas as circunstâncias "chocantes e comoventes" em que Cardoso morreu, entende que haja certas emoções exacerbadas, mas que há pessoas que já estão a usar o malogrado para outros fins que vão para alem da exigência de se fazer justiça. Langa disse que "há uma tentativa de manipulação da sociedade". metical - arquivo 2001 |