Direitos da Mulher, Direitos Humanos
Esta é a terceira edição especial do NotMoc para o 7 de Abril.
Estas edições especiais têm por objectivo fazer ouvir algumas
vozes, marginais ao poder quase todas, comentando políticas e
criticando injustiças e desigualdades. Na realidade, se fizermos um
balanço, neste pais podem-se dizer indignidades sobre as mulheres
com toda a impunidade que nenhum protesto se levantará, apesar das
inúmeras ONGs que têm por objectivo a equidade nas relações de
género. Assim, pelo menos uma vez por ano, tentamos fazer o ponto
de situação. Os artigos que se seguem expressam pontos de vista e
sensibilidades diferentes, porque esta "tribuna" se quer plural,
condição essencial para o debate.
Para esta terceira edição a temática escolhida foi "Direitos da mulher,
direitos humanos", tomando em consideração que 1998 é o ano que a
ONU escolheu para tratar dos direitos humanos.
Em Moçambique, os discursos sobre a participação da mulher na Luta
Armada durante longo tempo legitimaram as reformas legais, que
garantiram perante a lei a igualdade de género (com limites,
entenda-se, como o confirmam a primeira e a última Lei da
Nacionalidade). O modelo das antigas combatentes, personalizado por
Josina Machel, é a prova de que as mulheres merecem a igualdade,
porque a conquistaram. Poucas vezes contestada, esta formulação
implicitamente reconhece que as mulheres têm o direito de
cidadania "por mérito", enquanto que os homens a têm por direito
próprio. Claro que quem julgou o mérito das mulheres para merecer
a cidadania foram os homens! Da mesma maneira que conceberam o
"Hino da Mulher" que ainda vamos escutar neste 7 de Abril de 1998,
e onde se reafirma que nós somos as companheiras do homem engajado.
Mas voltando à cidadania, ninguém se viu na necessidade de
justificar, p.e., que os homens teriam também o direito de voto
porque fizeram a L.A. Não houve, portanto, uma declaração
incondicional da plena igualdade de género.
As mulheres ganharam então em Moçambique uma igualdade jurídica e
receberam como tarefa, através da OMM, a participação no
desenvolvimento do país. A teoria social da Frelimo sobre a mulher
localizava nos sistemas de exploração a opressão da mulher, como
aliás qualquer outro partido de ideologia marxista. Prescreve-se
pois que a igualdade da mulher conseguir-se-á na medida em que for
eliminada a exploração do homem pelo homem, razão pela qual nunca
foi permitida a existência de uma organização feminina independente
da Frelimo. Até 1990 a OMM era a única e tinha como tarefa
principal mobilizar as mulheres para as políticas e prioridades
partidárias. Veja-se, p.e., como são definidos os membros da OMM:
"aqueles que aceitam sacrifícios, que se preocupam em primeiro
lugar pelos interesses do nosso Povo, aqueles que se dedicam em
servir a Revolução e consolidar o Partido para a criação de uma
nova sociedade" (1). Em nenhum momento se fala do empenhamento pela
causa de uma sociedade sem discriminação de género.
A persistência da desigualdade era e é explicada em termos de
"preconceitos", "sobrevivências arcaicas" de sociedades antigas.
Esta insistência em ver nas "mentalidades" a causa da desigualdade
da mulher, é de certa maneira negar a relação homem/mulher como
relação social. Como tal, as relações de género estão inscritas nas
instituições e nas políticas estatais.
Hoje, em 1998, depois de tantos anos passados sobre as promessas de
emancipação, o balanço da situação não nos torna optimistas. É
tempo de falar em feminismo, movimento pela causa da igualdade
entre homens e mulheres e contra qualquer tipo de exclusão. O
feminismo foi e continua a ser diabolizado. Tem sido apresentado
como sinal de decadência e de individualismo do mundo capitalista
e burguês e a OMM demarcou-se sempre firmemente de qualquer posição
que pudesse parecer "feminista". Na Conferência Extraordinária da
Organização em 1984, referia-se: "Muitas mulheres, sobretudo nas
cidades, tém uma má interpretação da emancipação. Tornam-se
agressivas para com os maridos, o que resulta muitas vezes no
divórcio. A eliminação das diferenças da discriminação da mulher
deve ser um processo gradual" (2).
A crer no que aqui se diz, talvez o que tenhamos que fazer é lutar
gradualmente sós, sem partidos políticos que nos fazem falsas
promessas, e irmo-nos tornando gradualmente agressivas, sobretudo
nos divórcios. E talvez, quem sabe?, o poder comece gradualmente a
contar connosco...
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