António Siba-Siba foi sacrificado em nome de quê? Há um ano, no dia 11 de Agosto, um sábado, soube da morte de Siba-Siba não pela informação, mas pelo telefone. Ainda o seu corpo jazia ao fundo das escadas do prédio da 25 de Setembro e já muitas pessoas nesta cidade sabiam da estranha morte do PCA do Banco Austral, pela via mais eficiente: o "boca-a-boca". Quando cheguei ao local já se aglomeravam duas ou três dezenas de pessoas, Ministros e altos funcionários deste Governo, polícias, jornalistas e alguns curiosos. A atmosfera era de tristeza, de espanto e sobretudo de revolta. Nos dias seguintes os jornais, incluindo o "metical" para onde escrevi sobre o assassinato, faziam eco destes mesmos sentimentos. A presença dos membros do Governo no local do acontecimento e a chegada, no mesmo dia, de elementos da polícia sul-africana para apoiar nas investigações, fizeram crer que, dada a experiência com outro assassinato no ano anterior, do jornalista Carlos Cardoso, desta vez o processo ia em frente, rápido e transparente. O autor ou autores do crime juntamente com as suas motivações, iam ser conhecidos, julgados e punidos. Doesse a quem doesse. Especulações não faltavam e todas giravam à volta do escândalo levantado pela revelação dos nomes dos devedores do Banco Austral. Sabia-se que a divulgação destes nomes fora da responsabilidade do PCA interino, disposto a cumprir o mandato de reaver os créditos mal parados. A opinião mais partilhada era de que o assassino, ou pelo menos o mandante, estava entre os nomes citados na lista dos credores. A própria polícia chegou a afirmar que tinha suspeitos. Mas suspeitos toda a gente tinha. O que se pretendia era que a polícia apresentasse acusados perante o tribunal. Passou um ano e as perguntas agora são à Ministra das Finanças que marcou presença no local, na manhã fatídica: Senhora Ministra Luisa Diogo, durante estes 12 meses tem pedido contas aos seus colegas do Interior e da Justiça? Senhor Governador do Banco Central, Adriano Maleiane, que também lá estava e nos garantiu, no dia seguinte ao crime, que não iria deixar pedra sobre pedra até ver o caso esclarecido: tem insistido junto das autoridades competentes para saber a verdade? E vocês, economistas, incluindo a geração do próprio Siba-Siba: que lição tiram destes acontecimentos? Aprenderam só que é preciso "não fazer ondas"? Muito se fala da degradação dos valores morais neste país. O melhor exemplo é o que se passou durante este ano, não por causa dos criminosos, corruptos e ladrões, mas por causa daqueles que os conhecem e com eles convivem, mas olham de lado para poder fingir que não sabem nada. Os mais jovens, são aqueles de quem se pensa que são inocentes e ainda estão imunizados contra o cinismo e o oportunismo. Mas aí está o engano. Pouco depois da morte de Siba-Siba dizia um deles: precisamos dos jornalistas porque são os que têm coragem para denunciar! Afinal estava a confessar que ele e os seus pares são cobardes e egoistas, atirando para as costas dos jornalistas a responsabilidade de lutar contra o mal que penaliza os cidadãos e morrer por isso se for preciso. António Siba-Siba Macuácua deixou uma lição aos seus contemporâneos: a de que é preciso cumprir os deveres inerentes ao mandato
que se recebeu e que cada profissão e cada cargo tem a sua ética que se deve respeitar até às últimas consequências. Se todos os outros
profissionais e detentores de cargos públicos ou de interesse público, em Moçambique, fizessem o mesmo não estávamos aqui, um ano depois, a fazer a
mesma pergunta: porque morreu Siba-Siba e quem o matou? Maria de Lourdes Torcato [a seguir: Siba Siba: convite à lembrança] Savana - 2002 |