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7 de Abril 1998

Direito De Controlo Do Seu Próprio Corpo:
Pôr A Tecnologia Reprodutiva Ao Serviço Das Mulheres

por Ana Loforte

Quando se fala em planeamento familiar tem-se ignorado sistematicamente a opinião das mulheres, cujos interesses nem sempre são convergentes. No controlo dos nascimentos a vontade e necessidades individuais podem tornar-se dependentes dos desígnios e orientações dos programas dos governos ligados ao controlo demográfico e de redes e organizações de planeamento familiar. Intervêm ainda instituições religiosas imbuídas de ideologias de controlo sobre a consciência, os corpos e a sexualidade individual. Na verdade, ao nível das relações pessoais nas quais se determinam as decisões sobre a reprodução, actuam sobretudo variáveis que têm a ver com a sexualidade, as relações de género, as representações e construções da identidade e as aspirações ao bem-estar e qualidade de vida.

Embora seja importante salvaguardar a saúde da mulher pelo espaçamento dos nascimentos, é igualmente imprescindível observar cuidadosamente os efeitos secundários resultantes do uso de certo tipo de anticonceptivos como sejam perder ou ganhar peso, dores de cabeça, hemorragias, alterações no temperamento. Em condições ideais, as mulheres que usam anticonceptivos deviam ser sujeitas a exames médicos e receber conselhos antes da escolha de qualquer um dos métodos actualmente existentes (DIU, pílulas, depo-provera). O controlo regular e a análise do impacto na saúde da mulher pela utilização de um determinado método, deveria ser parte integrante dos programas de planeamento familiar. Há indícios de que estes aspectos tem recebido pouca atenção nos programas, ainda que se advogue que o planeamento familiar é um programa de saúde visando reduzir as taxas de morbilidade e mortabilidade materna e as complicações resultantes da gravidez.

Constata-se que muitas mulheres estão preocupadas com a sua saúde reprodutiva e que procuram acatar os programas de planeamento familiar. Todavia, as complicações resultantes do uso de certos meios contraceptivos e peso de uma tradição pró-natalista poderão comprometer os programas e o desejo das mulheres em contribuir para a melhoria da sua própria saúde e o exercício dos seus direitos reprodutivos.

A tecnologia permite o exercício da decisão reprodutiva, mas as dificuldades encontradas e os efeitos colaterais tornam difícil a sua apropriação e controlo. O corpo não pode ser violentado pois os direitos reprodutivos encerram responsabilidades para com o próprio corpo. Os programas de planeamento familiar poderão tornar-se controversos a não ser que sejam acompanhados por serviços auxiliares de apoio.

É também altura de relançar o debate sobre o aborto, gratuito e acessível a todas as mulheres. As modalidades em que tem vindo a ser praticado, tal como se discutiu anteriormente (NotMoc nº 76, de 7 Abril de 1996), beneficia somente as mulheres que têm acesso rápido aos serviços de saúde e que podem pagar os custos dessa intervenção. Que este debate vai ser feroz, não temos dúvidas. Mas o que deve pesar são os interesses e as necessidades das mulheres, e não os argumentos que defendem tradições familiares que o discurso político (masculino!) interpreta como garantes da honra e da moçambicanidade. O problema é que o peso de sustentação das tradições recai sobretudo sobre as mulheres. Ou, como disse uma sociológica a propósito da Argélia, "Quando uma sociedade está em mutação recai sobre as mulheres o papel de incarnar a estabilidade, a permanência, a nacionalidade e os seus símbolos" (Monique Gadant, "Schaharazade, les histoires et l'Histoire ou les pouvoirs des mille et une nuits", 1990).

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